‘Não lutamos mais com flecha’, diz indígena do Tocantins que foi recebido pelo Papa Francisco
“Hoje não lutamos mais com arco e flecha, nossa luta é com a Constituição e isso só foi possível por causa da educação”. Essa frase é do agora professor do curso de formação de professores em magistério indígena e presidente do Conselho de Educação Escolar Indígena do Estado do Tocantins (CEEI), Adriano Dias Gomes Karajá.
Indígena do povo Karajá-Xambioá, Adriano Karajá, de 34 anos, é natural da Aldeia Manuel Achure, município de Santa Fé, região norte do Tocantins. Lá, ele concluiu o ensino fundamental na Escola Indígena Waxiho Bedu e o ensino médio no Centro de Ensino Médio Indígena Karajá-Xambioá. Ainda na infância, ele aprendeu lições que levaria para a vida.
“Inseridos em uma realidade de extrema pobreza, minha mãe [Deusuita Achure Karajá] sempre me dizia: ‘Eu não tenho dinheiro nem condição e a única coisa que eu posso oferecer a vocês é a educação’. Ela sempre dizia isso quando estávamos desmotivados e não queríamos ir para a escola. E eu levo essa lição comigo”, destacou Adriano Karajá, que perdeu a mãe em 2014.
Logo após ter concluído o ensino médio, em 2006, ele teve a oportunidade de entrar pela primeira vez em uma sala de aula como professor, quando foi substituir o tio Juscelino Achure Karajá, servidor efetivo da rede estadual de ensino, que atuava na educação infantil e teve que fazer uma viagem de última hora. “Foi aí que eu descobri o caminho que iria seguir”, contou.
De 2008 a 2010, Adriano atuou como professor do ensino fundamental. Em 2009, ingressou no curso de formação de professores em magistério indígena, que concluiu em 2012. Após concluir o magistério, em 2013, ele começou o curso de geografia pela Universidade Federal do Tocantins (UFT). Durante a graduação, foi bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica nas Ações Afirmativas (Pibic –AF).
Sua pesquisa como bolsista resultou no livro “Aspectos históricos e culturais do povo Karajá-Xambioá”, sob a orientação do professor doutor Francisco Edviges Albuquerque. A produção, lançada em setembro de 2016, também contou com o apoio de Juscelino Achure Karajá, tio de Adriano que lhe abriu as portas para que ele ingressasse na educação. Juscelino viria a falecer pouco mais de dois meses após o lançamento da obra, que conquistou o prêmio de Iniciação Científica do MEC.
Um ano após concluir sua graduação, em 2018, Adriano ingressou no mestrado do Programa de Pós-Graduação em Letras (PPGL) da UFT, em Araguaína, e no mesmo ano se tornou presidente do Conselho de Educação Escolar Indígena do Estado do Tocantins, tendo sido reconduzido ao cargo em 2020. Ainda paralelo aos seus estudos, em 2019, se tornou professor do curso de formação de professores em magistério indígena.
Adriano Karajá coleciona muitos momentos marcantes em sua trajetória. Durante a sua graduação, foi vice-presidente da União dos Estudantes Indígenas do Tocantins. Em 2013, durante a Jornada Mundial da Juventude, foi um dos três jovens indígenas que foram ao Rio de Janeiro para se encontrarem com o papa Francisco. Ele foi o responsável pela entrega do documento em que pediram ao Santo Padre que intercedesse pelas causas indígenas junto ao Governo Brasileiro.
“Nos últimos anos, a Secretaria de Estado da Educação, Juventude e Esportes (Seduc) vem abrindo portas importantes para a formação dos nossos jovens, nos ajudando a termos uma visão melhor dos nossos direitos. Mas a sociedade ainda tem uma visão preconceituosa e limitante em relação aos povos indígenas. Já ouvi muitas vezes: ‘para que tanta terra para poucos índios?’, quando não dizem coisas piores. E a educação nos dá condição de lutarmos contra esse tipo de coisa”, finalizou Adriano Karajá.