Araticum, baru e taturubá: frutos da Amazônia e do Cerrado estão no foco de pesquisas no Tocantins
Com a maior biodiversidade do mundo, o território do Brasil abrange seis biomas e três ecossistemas marinhos, sendo o lar de mais de 100 mil espécies de animais e mais de 40 mil de vegetais conhecidos. Grande parte da riqueza ambiental brasileira se deve ao fato de o país deter 60% da maior floresta tropical do mundo: a Amazônia.
Outro responsável pela ampla biodiversidade do país é o Cerrado. Abrangendo doze estados da Federação, a savana brasileira é o segundo maior bioma sul-americano e apresenta, por exemplo, grande diversidade de frutos que possuem, além de sabor e aroma característicos, alto valor nutricional e propriedades antioxidantes.
Na Universidade Federal do Tocantins (UFT), a riqueza, peculiaridades e potenciais da Amazônia e do Cerrado – biomas que compõem o Estado – vêm sendo, há anos, estudados por pesquisadores da instituição, em vários de seus programas de pós-graduação.
No Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PPGCTA), por exemplo, a professora Glêndara Aparecida de Souza Martins vem pesquisando compostos bioativos de frutos oriundos da flora nativa da Amazônia e do Cerrado. Os trabalhos da cientista, que também é vinculada ao curso de Engenharia de Alimentos da UFT, no campus de Palmas, visam ao desenvolvimento de novos produtos, à biotecnologia e, em especial, à bioprospecção, com a qual Glêndara trabalha já há cerca de uma década.
“A ideia de me dedicar à bioprospecção surgiu em 2014, a partir do momento em que fui ampliando meu conhecimento sobre o potencial da flora nativa da região. Além disso, no cenário nacional e internacional, a Amazônia, principalmente, sempre esteve em destaque no que se refere a sua biodiversidade”, comenta a pesquisadora.
Mas, afinal, o que é bioprospecção?
A bioprospecção é a técnica utilizada para explorar fontes naturais de pequenas moléculas, macromoléculas e informações bioquímicas e genéticas que podem ser transformadas em novos produtos.
Ela utiliza esses compostos orgânicos para a obtenção de produtos de interesse comercial, principalmente para as áreas de farmácia, agricultura, cosmética e química. Trata-se de uma técnica empregada desde o início da civilização: na forma de cultivo, domesticação de espécies selvagens, entre outras atividades.
“Essa é uma etapa importante para o conhecimento da biodiversidade, uma vez que a ampla maioria desses frutos tem compostos já utilizados pelas populações tradicionais no tratamento de doenças”, afirma Glêndara.
Sabor, aroma e propriedades antioxidantes
Os frutos da flora nativa são alvos constantes de estudos que apontam para sua importância cultural e nutricional, além de seu potencial terapêutico e farmacológico. Sobretudo, a capacidade antioxidante desses frutos chama a atenção dos pesquisadores pelo fato de poderem minimizar os impactos dos radicais livres no organismo humano, associados a doenças degenerativas.
“São as pesquisas que nos mostram quais são os compostos e suas quantidades que, uma vez ingeridos, trarão benefícios à saúde”, explica a pesquisadora. “Os estudos servem para nos direcionar sobre possíveis aplicações dos compostos extraídos dos frutos, que posteriormente poderão ser levados ao consumidor, independente da sazonalidade“, pontua.
Estudando a geleia de araticum
Também conhecido por marolo, o fruto do araticum tem formato circular achatado, de epicarpo rígido. Quando maduro, apresenta coloração amarelada ou rosada. A fruta exótica apresenta alto potencial nutricional e tecnológico e pode ser transformada em doces, geleias, sucos, licores, tortas, iogurtes e sorvetes.
“Quando trabalhamos com a geleia, a intenção era agregar valor a uma matéria prima que já é comercializada na região a baixo custo. Então, isso soma qualidade nutricional com os aspectos regionais, que são tão importantes”, pontua a pesquisadora.
No entanto, como a frutificação do araticum ocorre apenas entre setembro e janeiro, a sazonalidade é o maior contratempo para a realização das pesquisas. “O empecilho de trabalhar com esses frutos é sempre a sazonalidade e a proporção da polpa e da semente, que requerem o uso de técnicas de aproveitamento integral do fruto, com segurança”, detalha Glêndara.
A produção da geleia de araticum, além de permitir o consumo do fruto durante todo o ano, contribui para geração de renda aos pequenos agricultores que trabalham com essas frutas. No âmbito científico, as pesquisas podem contribuir com novas informações sobre esta fruta nativa do cerrado, que ainda são escassas.
Entre os resultados já alcançados pelo trabalho científico de Glêndara, está o desenvolvimento da geleia de araticum com substituição da pectina comercial pela do maracujá, que é utilizada como geleificante ou estabilizante, podendo ser extraída da casca de maracujá amarelo.
A valorização agroindustrial do óleo de amêndoa de baru
Outro trabalho da pesquisadora está relacionado ao baru. Já bastante utilizado pela indústria de cosméticos, o óleo da amêndoa do baru se torna, muitas vezes, não comestível pela forma como é extraído o óleo, uma vez que são utilizadas substâncias químicas no processo de extração.
Sendo assim, a pesquisadora buscou técnicas sustentáveis para a extração do óleo, a fim de expandir seu uso também para indústria alimentícia. “Conseguimos propor ajustes em alguns métodos para aplicarmos à semente e obtermos todas as suas propriedades benéficas, não só para cosméticos, mas também para alimentação”, elucida.
Rica em proteínas, lipídios, fibras, compostos bioativos e potencial antioxidante, a castanha de baru é uma semente comestível proveniente do baruzeiro, árvore do Cerrado brasileiro, que está ameaçada de extinção. “De todas as pesquisas que nós realizamos, cada uma tem uma particularidade. É muito satisfatório quando se encontra um produto in natura, que é vendido a baixo custo, receber valor agregado“, destaca.
Estudando um fruto pouco conhecido: o taturubá
Com pouca literatura disponível, a mestranda do PPGCTA, Gabriela Leal, tem usado a bioprospecção para pesquisar o taturubá, fruto nativo da Amazônia. “Estou estudando quais compostos nutricionais esse fruto possui, os benefícios à saúde que ele proporciona, sua composição, além de utilizar, na extração dos compostos, métodos mais ecológicos e solventes verdes”, explica.
De cor amarela vibrante e uma semente brilhosa, Gabriela não conhecia o fruto antes de ingressar na pós-graduação da UFT. “Antes de iniciar meu projeto de pesquisa, eu não conhecia o fruto. Foi um parceiro, em Araguatins (TO), que o apresentou a mim. E, antes de estudar um fruto, sempre buscamos tanto o conhecimento popular sobre ele quanto o conhecimento científico disponível”, aponta.
A mestranda pretende, ao final do projeto, conseguir encapsular os compostos coletados, a fim de deixá-los disponíveis tanto para a indústria de alimentos, que pode adicioná-los em novas formulações de produtos, quanto para a indústria farmacêutica.
Bioativos na pesquisa e inovação
Juntamente com os alunos do PPGCTA, a professora e pesquisadora Glêndara Martins vem trabalhando também com os frutos oiti e puçá, por meio da análise de suas composições químicas e da extração de seus bioativos.
“Para a extensão tecnológica da Universidade, essa tecnologia social é muito importante, é um dos papéis da Universidade sendo cumpridos. Mas também é bastante animador quando se começa a realizar novas descobertas que podem acrescentar impactos positivos ao ramo”, salienta.
Para saber mais sobre os trabalhos de professores-pesquisadores e alunos do PPGCTA, bem como outros detalhes sobre o Programa (editais, informações gerais, corpo docente e outros), acesse o site: www.uft.edu.br/ppgcta.