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FLORESTA PÚBLICA TIPO B” E SEUS IMPACTOS NA AMAZÔNIA LEGAL

No ano de 2006 foi editada a Lei n. 11.284 que trata da Gestão de Florestas Públicas criando o Serviço Florestal Brasileiro. A Lei das Flonas ou Lei da Gestão de Florestas Públicas permite a exploração de Florestas na Amazônia Legal por até 40 anos e sem limite de quantidade de área. Isso mesmo! 40 anos para que uma empresa internacional possa explorar a madeira, a biodiversidade, extrair essências da Floresta Amazônica e explorar tudo o que tem direito!

Entretanto, a Lei n. 11.284/2006 contrariou dispositivos da Lei de Aquisição de Terras por Estrangeiro (Lei n.º 5.709/71) pois não fixou limite de área para exploração das Florestas e ainda possibilitou a exploração por até 40 anos. Diante de todo esse prazo qual a razão para que um estrangeiro ou empresa estrangeira queira se submeter ao crivo da Lei n.º 5.709/71 (Lei de Aquisição de Terras por Estrangeiro) para exploração comercial de uma Floresta no Brasil?

O art. 3º da Lei n.º 5.709/71 estabelece que “A aquisição de imóvel rural por pessoa física estrangeira não poderá exceder a 50 (cinqüenta) módulos de exploração indefinida, em área contínua ou descontínua.” Entretanto a Lei das FLONAS permite a exploração por até 40 anos, sem limite de área, não justificando mais que empresas estrangeiras, na Amazônia Legal, tenham interesse ou queiram se submeter as regras da Lei n.º 5.709/71 e a fiscalização e aprovação do INCRA. O art. 23 da Lei n. 8.629/93 também limita inclusive o arrendamento de terras para estrangeiro: Art. 23. O estrangeiro residente no País e a pessoa jurídica autorizada a funcionar no Brasil só poderão arrendar imóvel rural na forma da Lei nº 5.709, de 7 de outubro de 1971.

Sobre esse tema foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADIN 3938 onde se questionou o art. 10 da Lei n. 11.284/2006 que instituiu o Plano Plurianual de Outorga Florestal (PPAOF) em áreas acima de 2.500 hectares, considerando que a Constituição Federal obriga a consulta prévia ao Congresso Nacional para aquisição acima de 2.500 hectaers. O STF julgou a ADIN 3938, de relatoria do Ministro Dias Toffoli e reconheceu que a autorização prévia do Congresso Nacional não se aplica a Lei das Flonas, porquanto a concessão de florestas públicas se assemelha a exploração “de recursos minerais ou energéticos”. Quem viver verá!

Somente para ilustrar o que ocorreu no início da vigência das Lei das Flonas inicialmente a partir do ano de 2002 foram licitadas para a elaboração de plano de manejo as seguintes FLONAS: Trairão (257 mil hectares); Jamanxin (1,3 milhões hectares); Crepori (740 mil hectares) e Flona Amaná (540 mil hectares) sendo que as contratações na época foram feitas por edital e concorrência pública dentro das normas do PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Cada um tire sua conclusão diante desses números!

FLORESTA PÚBLICA TIPO B – INCONSTITUCIONALIDADE

Coincidência ou não, novamente no Governo Lula, a Lei n. 11.284/2006 sofreu uma profunda modificação por meio da edição do Decreto n. 11.688/2023 que criou as Florestas Públicas Tipos: A (florestas inseridas em Unidades de Conservação Terras Indígenas, Assentamentos destinadas a conservação do meio ambiente); B (florestas localizadas em áreas arrecadadas pelo Poder Público ainda sem destinação); e C (florestas localizadas em terras devolutas) fixando limitações às destinações de cada uma.

Ocorre que o Decreto n. 11.688/2023 obstaculizou a aplicação da Lei de Regularização Fundiária. Enquanto a Lei das Flonas permite o uso de terras por estrangeiros, sem limite de área e por até 40 anos, contrariando a Lei n.º 5.709/71, o novo Decreto que modificou a Lei das Flonas contraria frontalmente a Lei n. 11.952/2009 (Lei de Regularização Fundiária na Amazônia Legal) ao criar a FLORESTA PÚBLICA TIPO B (áreas arrecadadas pela UNIÃO FEDERAL sem destinação) e impedir a destinação dessas áreas para atividades que não sejam de conservação, ou seja, não prevê que tais áreas possam ser utilizadas para exploração da agricultura, pecuária ou silvicultura. O art. 3º da Lei n. 11.952/2209 garante o direito a regularização fundiária: art. 3º São passíveis de regularização fundiária nos termos desta Lei as ocupações incidentes em terras: I – discriminadas, arrecadadas e registradas em nome da União com base no art. 1º do Decreto-Lei n. 1.164 de 1º de abril de 1971;, ou seja, no Estado do Tocantins inclusive que teve grande parte do seu território arrecadado nas margens da BR 153.

O grande prejuízo para aqueles que pretendem a regularização fundiária é patente a partir da observação das restritas destinações das áreas consideradas como FLORESTA PÚBLICA TIPO B, conforme previsto no art. 13, §9º do Decreto n. 11.688/2023: a) criação ou destinação de áreas para unidades de conservação; b) regularização de territórios quilombolas; d) demarcação ou regularização de povos ou comunidades tradicionais; e e) concessões, nos termos da Lei n. 11.284/2006 (exploração comercial das FLONAS).

A criação da estapafúrdia figura jurídica “FLORESTA PÚBLICA TIPO B” agride o direito dos ocupantes ou daqueles que de alguma forma possuem o direito de buscarem a regularização fundiária de suas áreas para produzirem ou continuarem produzindo.

O próprio INCRA, a partir da edição do Decreto n. 11.688/2023 encontrou óbice para dar andamento nos processos de regularização fundiária de áreas agora classificadas como FLORESTA PÚBLICA TIPO B tanto que o Diretor de Governança Fundiária do INCRA determinou o sobrestamento dos processos em andamento e a Procuradoria Federal Especializada também opinou no sentido de que as áreas classificadas como FLORESTA PÚBLICA TIPO B não podem ser destinadas para fins de regularização fundiária, conforme Parecer n. 00164/2023/EQUAD-FUNDADM/PFE-INCRA-SEDE/PGF/AGU. O que o INCRA vai fazer ?

A criação da figura da FLORESTA PÚBLICA TIPO B é uma ardilosa sobreposição de limitação de uso sobre TERRAS PÚBLICAS DA UNIÃO desnecessária e prejudicial à tão sonhada reorganização fundiária na Amazônia Legal.

Além de não cumprir o objetivo final de preservar florestas, se é que isso fosse a pretensão de fato do Decreto n. 11.688/2023, tal alteração é totalmente desnecessária e descabida, considerando que a Lei do Sistema Nacional de Unidade de Conservação – SNUC (Lei n. 9.985/2000) já prevê a forma, critérios e destinação das florestas e áreas de relevante interesse ambiental na forma de Unidades de Conservação de Proteção Integral ou de Uso Sustentável, não havendo necessidade alguma de edição de outra legislação para regular essa matéria tratada na Lei do SNUC.

Aliás, hoje o Brasil possui mais de 334 Unidades de Conservação pendentes de regularização fundiária em sua grande maioria sem pagamento de indenização aos proprietários que possuem registro imobiliário. E agora, além de usurpar terras particulares sem a prévia e justa indenização, o Governo Federal ainda impede a regularização fundiária das ocupações sob a tese teratológica de preservação de FLORESTA PÚBLICA TIPO B que não se presta a ser explorada, a não ser para fins de conservação. Tal classificação absurda não foi precedida sequer de estudos técnicos, zoneamento ambiental ou debate público na Amazônia Legal. Ao contrário o Presidente da República editou um decreto e desconsiderou a possibilidade jurídica do direito as regularizações de milhões de hectares transformando de forma irracional a classificação de áreas exploradas com atividades produtivas em FLORESTA PÚBLICA TIPO B com extrema limitação de uso. A quem interessa tanta preservação, tanta limitação de uso das áreas passíveis de exploração na Amazônia Legal?

De forma prática a classificação de FLORESTA PÚBLICA TIPO B implica em problemas seríssimos para o ocupante, como a sobreposição no Cadastro Ambiental Rural – CAR, negativa de acesso a crédito e impedimento ao deferimento do pedido de regularização fundiária junto ao INCRA.

Entendo, que seja necessário o ajuizamento de uma Ação de Direta de Inconstitucionalidade junto ao Supremo Tribunal Federal questionando o art. 13, §9º do Decreto n. 11.688/2023 que criou a FLORESTA PÚBLICA TIPO B e impediu a destinação de tais áreas para as regularizações fundiárias de ocupantes em milhões de hectares de terras públicas da UNIÃO FEDERAL, algumas inclusive em processo de regularização, além de ter instituído uma limitação para o próprio trabalho e papel do INCRA. Nada de novo nessa nova página da história na região da Amazônia Legal marcada por ingerências políticas convenientes e obstáculos ao desenvolvimento que de tempos em tempos mudam o rumo do caminho natural do progresso, trazendo mais insegurança jurídica fundiária e prejudicando àqueles que pretendem continuar produzindo.

 

 

 

 

 

Edmar Teixeira De Paula Júnior – Advogado
Especialista em Direito Agrário – UFG/GO
Especialista em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável – UNB/BRASÍLIA
Advogado da PROBICO – Associação dos Produtores do Bico do Papagaio/TO