BrasilDestaque

Isoladas, idosas de grupo de cantigas em favela de BH driblam a saudade cantando, dando de comer às galinhas e fazendo videochamada

“Hoje eu ouvi Jovem Guarda a manhã toda. Dancei, espantei a tristeza”, disse Sueli Avelino, de 64 anos, moradora da favela do Alto Vera Cruz, na Região Leste de Belo Horizonte. Ela está isolada com o marido em casa e não vê os filhos e os cinco netos há dois meses por causa da pandemia do novo coronavírus.

“Eu fico na janela e eles passam na porta rapidinho. Uma saudade que eu tô! Mas não pode. Ainda mais eu que passei pro transplante de medula óssea”.

O grupo cultural Meninas de Sinhá surgiu na favela do Alto Vera Cruz há mais de 20 anos — Foto: Lígia Nassif/DivulgaçãoO grupo cultural Meninas de Sinhá surgiu na favela do Alto Vera Cruz há mais de 20 anos — Foto: Lígia Nassif/Divulgação

O grupo cultural Meninas de Sinhá surgiu na favela do Alto Vera Cruz há mais de 20 anos — Foto: Lígia Nassif/Divulgação

Sueli é uma das 22 mulheres que fazem parte do grupo cultural Meninas de Sinhá. Criado em 1996, no Alto Vera Cruz, ele resgata antigas cantigas de roda e a tradição da oralidade.

Com o isolamento social, as atividades das Meninas de Sinhá, que têm entre 54 e 95 anos, foram suspensas em março. Nas primeiras semanas, muitas destas senhoras ficaram abatidas. O grupo, além de levar música, era um importante instrumento de combate à depressão.

Doações para As Meninas de Sinhá são separadas na sede do grupo — Foto: André Cavaleiro/Arquivo pessoalDoações para As Meninas de Sinhá são separadas na sede do grupo — Foto: André Cavaleiro/Arquivo pessoal

Doações para As Meninas de Sinhá são separadas na sede do grupo — Foto: André Cavaleiro/Arquivo pessoal

“Nos primeiros dias eu fiquei muito triste. A gente se apresentava, né? Ensaiava. Fazia oficina. Até gosto de ficar dentro de casa, mas não obrigada”, contou Dorvalina Maria de Oliveira, de 68 anos. Ela mora sozinha e tem passado o tempo cuidando da casa e de si mesma.

“Arrumo meus armários, comprei uma terra para minhas plantas, faço videochamada com as meninas. Aprendi, né?”, disse ela.

Favela Alto Vera Cruz, na Região Leste de Belo Horizonte — Foto: André Cavaleiro/DivulgaçãoFavela Alto Vera Cruz, na Região Leste de Belo Horizonte — Foto: André Cavaleiro/Divulgação

Favela Alto Vera Cruz, na Região Leste de Belo Horizonte — Foto: André Cavaleiro/Divulgação

Bernardina de Sena, de 73 anos, que mora na favela do Taquaril, vizinha do Alto Vera Cruz, tem feito caminhadas ao redor da casa, alimentado as galinhas e brincado com cachorro.

“Também tenho feito bordados. Assisto aos cursos no Youtube, né? Assisto missa pela televisão e converso muito com minhas amigas. Não estou sozinha. Só fisicamente sozinha”, contou ela que também mora sozinha.

No quintal, Bernardina se exercita e dá de comer às galinhas — Foto: Bernardina de Sena/Arquivo pessoalNo quintal, Bernardina se exercita e dá de comer às galinhas — Foto: Bernardina de Sena/Arquivo pessoal

No quintal, Bernardina se exercita e dá de comer às galinhas — Foto: Bernardina de Sena/Arquivo pessoal

Consideradas “as mães e avós da favela”, a preocupação na comunidade é geral. Por causa disso, doações têm sido feitas para levar alimentos às Meninas de Sinhá.

“Eu já ganhei minha cestinha, meu arrozinho. Tudo certo”, disse Dorvalina.

Mas e a cantoria? Acabou? “Acabou nada, menina. A gente canta em casa, no celular. Não pode deixar a tristeza nem esse coronavírus chegar. Água, sabão, álcool gel, máscara e cantoria”, disse Sueli que canta assim:

“Quem são aquelas, meu bem? Que vivem a cantarolar? Cantigas de roda, as Meninas de Sinhá”.

Alto Vera Cruz

O Alto Vera Cruz fica na Região Leste de Belo Horizonte. A favela reúne hoje mais de 47 mil moradores e é uma das maiores da capital.

A ocupação começou nos anos 50 quando terras de três fazendas da região foram compradas e depois abandonadas pela então Companhia Mineradora de Belo Horizonte.

  • População: 47.530 pessoas
  • Localização: Região Leste de Belo Horizonte
  • Origem: Ocupação começou em 1950 em uma área abandonada pela Companhia Mineradora de Belo Horizonte

Fonte: G1 – Minas Gerais