Júri condena 25 PMs a 624 anos de prisão pelo massacre do Carandiru
A Justiça paulista encerrou na madrugada deste sábado (3) o julgamento da maior e mais violenta etapa do episódio que ficou conhecido como o massacre do Carandiru. Os jurados decidiram condenar 25 policiais militares da Rota (tropa de elite da PM paulista) acusados da morte de 52 presos que estavam no terceiro pavimento do pavilhão 9 do presídio no dia 2 de outubro de 1992. Eles receberam uma pena de 624 anos de reclusão cada um. Eles poderão recorrer em liberdade.
O julgamento do caso já é considerado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo o maior já realizado pela Justiça do Estado e representa uma segunda etapa: em abril, no primeiro júri do massacre, 23 PMs haviam sido condenados a 156 anos acusados da morte de 13 internos que estavam no segundo pavimento do presídio. Ao todo, o massacre –assim classificado pela OEA (Organização de Estados Americanos) no ano 2000 —teve 111 mortos e 84 policiais denunciados. Destes, 78 estão vivos. Mais dois julgamentos do caso ocorrerão em outubro e fevereiro.
Diferente do primeiro julgamento, a decisão que condenou os 25 policiais neste sábado determina a perda dos cargos dos policiais “em razão do inequívoco abuso de poder”. No entanto, isso só deve ocorrer depois que se esgotarem todos os recursos da defesa.
O segundo júri durou uma semana no Fórum Criminal da Barra Funda, zona oeste de São Paulo. A sentença foi lida pelo juiz Rodrigo Tellini de Aguirre Camargo, às 4h20, quatro horas depois do fim dos debates entre acusação e defesa.
Durante toda a sexta-feira (2), os promotores Fernando Pereira da Silva e Eduardo Olavo Banco tentaram convencer os jurados de que os PMs agiram sem chance de defesa aos presos do pavimento. Com laudos de necropsia feitos à época pela Polícia Técnico-Científica e interrogatórios em que os PMs admitiam estar armados com revólveres e submetralhadoras, eles atestaram que ao menos nove a cada dez presos foram mortos com tiros na cabeça e no pescoço.
Além disso, ao menos sete em cada dez detentos assassinados foram atingidos por munições diferentes ou com disparos efetuados de trajetórias distintas.
Já a advogada de defesa de todos os réus, Ieda Ribeiro de Souza, que chorou após a leitura da sentença, recorreu a policiais militares portadores de deficiência e a parentes e amigos dos réus, em plenário, para reforçar o tom mais emocional, aos jurados, sobre a necessidade de atuação da PM. Ela disse que vai recorrer da decisão.
Dos condenados, só nove PMs ainda estão na ativa.
De 25 réus, 18 ficam em silêncio e cinco aceitam falar
Dos 25 réus, 18 permaneceram em silêncio diante do juiz e dos promotores. Alguns se se limitaram a alegar inocência perante o magistrado.
Dos cinco PMs que aceitaram falar durante o interrogatório –todos, hoje, oficiais –, o mais extenso foi o do tenente-coronel Salvador Modesto Madia, ex-chefe da Rota entre 2011 e 2012. Ele foi afastado da função sem setembro do ano passado em meio à elevação da taxa de homicídios na capital, em relação a períodos anteriores, e quase às vésperas de o massacre pelo qual é réu completar 20 anos.
Ex-chefe da Rota diz que não comemorou com “copo de sangue”
Ouvido por cerca de seis horas na quinta-feira (1º), Madia admitiu ter atirado em presos do pavimento que estariam armados, mas negou que ele ou qualquer integrante do grupo que estava sob seu comando, durante a incursão ao presídio, tivesse sido o autor de 73 mortes. Nessa sexta, o promotor Fernando Silva retirou 21 homicídios do cômputo atribuído ao grupo de réus por falta de provas que os relacionassem a essas mortes.
“O senhor acha que eu cheguei em casa e tomei um copo de sangue [para comemorar]?”, disse Madia ao juiz. “Aquele mar de mortos: o senhor pensa que não me chocou?”, declarou.
Sobre as mudanças na polícia desde o massacre, indagado pela defesa, o ex-chefe da Rota definiu: “Depois de 92, tudo na polícia mudou –ela [a corporação] deu condições para os homens trabalharem”, definiu, ressalvar: “Uma coisa não mudou: eu vejo o sistema penitenciário um lixo”.
(UOL)