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‘Malhação’ faz 20 anos e atores que marcaram época na novela se reencontram para matar a saudade

2015-804609661-2015040208266.jpg_20150402Quem foi adolescente nos idos de 1995 provavelmente se empolga mais que o normal quando ouve Lulu Santos cantando “Assim caminha a humanidade”. Pode ser também que grite, mesmo que para si, “Cabeção!”, se cruzar com Sérgio Hondjakoff pela rua. Eu suspiro ao lembrar do Dado de Claudio Heinrich, que tinha uma história fofa com a personagem de Fernanda Rodrigues — que por sinal era minha xará na história!

São muitas lembranças nesses 20 anos de “Malhação”, que foi ao ar pela primeira vez em 24 de abril daquele ano. Para reavivar os bons tempos, a Canal Extra reuniu atores de diversas temporadas para falar de suas tramas — e de fofocas de bastidores, claro. Entre gargalhadas e muitas histórias, a certeza de que ficou um gostinho de quero mais em cada um deles.

— Hoje em dia conheço gente que nasceu naquela época e fico desesperado — gargalha Bruno de Luca, o Fabinho da primeira temporada.

Atualmente com 32 anos, ele é apresentador do “Vai pra onde?”, do canal pago Multishow: — Comecei com 12. Foi legal porque marcou minha adolescência. A gente aprendeu a atuar junto. E depois desaprendeu…

Hoje professor de jiu-jitsu e “ainda ator” — frisa —, Claudio Heinrich, de 42 anos, diz que não podia ter estreado em lugar melhor.

— Eu tinha que melhorar muito ao longo da temporada. O legal é que já nos primeiros capítulos o público virou fã de carteirinha e isso me ajudou bastante. Acredito que muitos que começam ali têm sorte em outros trabalhos por conta disso, desse retorno positivo do público — pondera o Dado das temporadas de 1995 a 1997: — Tenho essa boa vida (ri) graças a “Malhação”. Até o jiu-jitsu começou lá. Sou totalmente grato e em breve voltarei à TV.

Enquanto Claudio fala, André Marques, de 35 anos, chega bagunçando o ambiente. “A falecida!”, grita ele para a ex-namorada e amiga Fernanda Vasconcellos, a Betina da 12ª fase (2005). A pergunta nessa hora era qual o momento mais marcante que eles viveram e viram em “Malhação”.

— Está puxado. Que reportagem é essa? Todo mundo respondeu? — brinca o apresentador do “SuperStar”.

— Estou esperando para colar um pouquinho da resposta de cada um — completa Bruno, gaiato.

Fernanda, hoje com 30 anos, tenta colocar ordem na casa.

— Para mim o mais marcante foi a mudança em geral. Eu não conhecia nada, nunca tinha trabalhado com roteiro. E a disciplina. Todo meu entendimento da profissão começou ali — valoriza a atriz, que aponta Cabeção e Mocotó, vivido por André, como personagens inesquecíveis.

Atores relembram 20 anos de 'Malhação'
Atores relembram 20 anos de ‘Malhação’ Foto: Roberto Moreyra / Agência O Globo

Um dos pais da novela, Emanuel Jacobina, de 53 anos, se empolga ao falar do espírito jovial que conduz sua cria.

— Ao contrário de Nelson Rodrigues, se eu pudesse dar um conselho aos idosos (que eles aceitariam com prazer), seria: rejuvenesçam, voltem a não ter medo da morte, voltem a tentar coisas diferentes — enfatiza o autor, que revela se reconhecer em vários dos personagens que escreveu, como Mocotó, Dado e Cabeção: — Me sinto como se fosse parte de cada um deles. A outra parte se deve a atores que eu adoro, como André Marques, Claudio Heinrich, Daniela Pessoa, Fernanda Rodrigues, Sérgio Hondjakoff, Priscila Fantin, Samara Felippo, Roger Gobeth e diversos outros.

“Malhação”, explica Jacobina, nasceu em uma oficina de dramaturgia para formação de autores da Rede Globo, em abril de 1994.

— Criado por Andrea Maltarolli (morta em 2009, em consequência de um câncer) e por mim, foi inspirado no grande boom de academias de ginástica que acontecia na época. Ao mesmo tempo, Andrea e eu sabíamos que faltava um programa voltado para adolescentes e jovens adultos. Acreditávamos, sim, que seria um sucesso — disserta o escritor, que colaborou para a novela ao longo dessas duas décadas e estará na próxima etapa, que começa em agosto.

Completando 40 anos hoje, Patrícia Moretzsohn “era meio que uma adolescente infiltrada” na sua estreia como autora — ela também escreveu esse primeiro ano com Márcia Prates, Andrea, Jacobina e Vinícius Vianna — e levou sua tão recente lembrança de adolescente para a novelinha.

— Foi uma fase muito marcante: eu adorava o meu colégio do Ensino Médio, praticava capoeira, andava sempre “em bando” com minhas amigas e os amigos da praia, estava descobrindo o mundo… Mesmo tendo começado a trabalhar cedo, não precisei abrir mão do que me fazia feliz, então… Como não amar? — derrete-se a autora, que foi supervisionada pela mãe, Ana Maria Moretzsohn, logo no início e a reencontrou em outras temporadas.

— Éramos Ricardo Linhares e eu de supervisores e a estreia da Patrícia, do Emanoel e da Andrea. Foi ótimo porque pude avaliar que, apesar de ser a mais moça, Patrícia era tão talentosa quanto os outros — elogia a mãe.

Atores relembram os 20 anos de 'Malhação'
Atores relembram os 20 anos de ‘Malhação’ Foto: Roberto Moreyra / Foto: Roberto Moreyra/Agradecimento: Cidade das Artes

“Um espetáculo semanal” foi a frase que Flávio Colatrello Jr., de 55, usou para resumir a novela que dirigiu entre 1995 e 1999:

— A gente sempre teve uma cabeça revolucionária. Era importante falar de temas como a Aids para esse público.

Novela da Globo há maior tempo no ar, “Malhação” não só reuniu e revelou uma gama de atores como permitiu encontros internacionais e fenomenais. Quando ainda namorava com o ex-jogador Ronaldo, Susana Werner contracenou com o então amado em 1997. Sua Mariana jogava num time de futebol feminino e Ronaldo participou como o técnico Betinho. “Malhação” também promoveu a volta da dupla Kadu Moliterno e André de Biase, o Juba e Lula de “Armação ilimitada” (1985). César e Vinícius, respectivamente, eram da temporada de 2002. Teve ainda a cantora canadense Alanis Morrissete (1996) e o roqueiro americano Bon Jovi (1997) fazendo participação.

— Nem era fã de Alanis. Mas me amarrei e me arrependi de não ter tirado foto — lamenta André Marques.

Participações assim levavam frescor para a novela, que com 20 anos de idade, passou por trocas constantes de elenco, autores, direção e público. Afinal, não somos adolescentes para sempre, não é?

As primeiras grandes modificações deram-se em 1998, quando o cenário da academia passou a dar lugar a um universo mais tecnológico. “Malhação.com” foi feito ao vivo e num único cenário: o quarto de Mocotó, que contava a história dos alunos pela internet, com participação do público. Já na temporada seguinte, os pesos e bicicletas ergométricas deram espaço ao lápis e ao caderno com o Múltipla Escolha.

— Aí o mundo adolescente já era uma realidade na televisão nacional e internacional. A consolidação do colégio como espaço para o adolescente se mostrar como é (longe dos pais e da família), ao mesmo tempo em que tem que lidar com a autoridade num momento tão delicado da vida é genial — pontua Patrícia Moretzsohn.

Essa temporada, inclusive, foi uma das mais polêmicas, com a discussão sobre o vírus HIV. Érica (Samara Felippo) era soropositivo e sofreu antes de ter seu final feliz com Touro (Roger Gobeth).

— Os anos 2000 estavam bombando com várias questões, como a doença. Era o auge da epidemia e tínhamos ainda o alcoolismo e o tabagismo. São coisas até hoje pouco abordadas, então era um grande projeto — explica Luiz Henrique Rios, de 54 anos, diretor-geral da temporada 2000/2001, entre outras: — Não tinha classificação indicativa, mas havia as leis. O Ministério Público sempre nos abordou, mas não teve conflito.

O ano também marcou a entrada de um dos personagens mais lembrados de “Malhação”. Apontado como “a grande revelação dessa fase”, o Cabeção de Sérgio Hondjakoff, o único a permanecer no programa por cinco temporadas, está na boca de todos os que acompanharam a trama.

— Lutei para aquele momento e aconteceu. Foi o sexto contrato na Globo (o primeiro foi “Contos de verão”, com 7 anos), mas foi o que marcou, me deixou mais conhecido — emociona-se o ruivo, que entrega ter tirado vantagem do cabelo exótico: — Com 13 anos, eu usava aparelho, era cheio de espinha. Aí entrei em “Meu bem querer” (1998). Gostava de aparecer, e tinha as meninas que pegavam no meu cabelo, achavam bonitinho…

No encontro, o ator era o maior alvo de brincadeiras, de forma carinhosa, é claro, dos amigos.

— Ih, Serginho com certeza foi o recordista de “Malhação”. Pegou todo mundo aqui, não? — brinca Thiago Rodrigues, de 34 anos, o Bernardo da 12ª temporada (2005): — Tem história de camarim que não dá para contar, né?— segue o Luís de “Sete vidas”.

O que ninguém negou é que todos aprontavam muito no set.

— Um diretor uma vez perguntou: “Você tem a ver com a cena? Estão pensando que são quem? Podem sair, seus moleques. E você também, gordinho” — gargalha André, apontando para Bruno, aos risos.

E a zoeira não parou por aí.

— Bruno se apaixonou por uma figurante uma vez, numa festa club. Era uma gatinha. A menina falou que queria entrar e ele disse que era filho do diretor. Quando vou lá em cima da caixa d’água do lugar, estava Bruno com a menina cheio de malemolência — entrega o amigo da onça André.

Juliana Paiva e Alice Wegmann se tornaram amigas nos bastidores da temporada 2012 de 'Malhação'
Juliana Paiva e Alice Wegmann se tornaram amigas nos bastidores da temporada 2012 de ‘Malhação’ Foto: Roberto Moreyra / Roberto Moreyra

Andrea na temporada de 2010 e Lia em 2012, a atriz Alice Wegmann, de 20 anos, ficava no cantinho rindo das histórias que admirava desde os 5, quando começou a assistir a novela escondida da mãe. “Ela falava que eu não podia ver e eu fugia para o quarto da babá. “Amiga-quase-irmã’’ de Juliana Paiva, a Fatinha da 20ª temporada, Alice resume bem a energia positiva que ficou no ar durante o encontro.

— Se ver todo dia é difícil mesmo, mas quando a gente se encontra, é como se tivéssemos falado com a pessoa anteontem. Você continua íntimo. A gente não perdeu o que criou — diz a moça, uma apaixonada confessa pela temporada da qual participou.

Juliana Paiva, que comprava os CDs com a trilha sonora da novela, entrega que até sonhava participar do elenco “bem antes de surgir a oportunidade”.

— Existia um receio meu da personagem não ser querida pelas meninas por conta da sua máscara de menina sem noção, inconveniente, avançadinha, que beijava o namorado das outras, aprontava. Mas conforme a gente foi trabalhando, mostrando as outras faces ou camadas, o jeito franco, romântico e transparente foi ficando mais fácil de entendê-la — lembra Juliana, de 22 anos.

Na expectativa pela volta, Jacobina defende que ainda há fôlego para muitos anos de “Malhação”:

— É natural que um dia acabe. Pode ser que isso aconteça daqui a outros 20 anos. Eu não sei. Mas é necessário que tenha na televisão aberta uma dramaturgia que tenha sempre como foco o universo do jovem e do adolescente.

Parcerias que migraram para fora da telinha

Mergulhando no túnel do tempo dos personagens inesquecíveis ao longo desses 20 anos de “Malhação”, é inevitável não parar em 1999, quando Touro (Roger Gobeth) e Érica (Samara Felippo) se encontraram no “Múltipla escolha”. A moça descobriu ser soropositivo e, após muita dor provocada pela desinformação, o casal superou de forma madura e emocionante o drama.

— Achei muito ousado. Nunca me esqueci de um programa de que participei, do Serginho Groisman, onde uma menina da minha idade na época contou que pegou aids na primeira transa — emociona-se Samara, de 36 anos, que esteve recentemente no ar em “Os dez mandamentos”, na Record, ao lado de Roger: — Ele será meu parceiraço para sempre.

O ator, de 42 anos, comemora até hoje ter sido o interlocutor de um assunto tão sério logo em sua estreia em novelas.

— Foi educativo. A gente tinha a conversa com o jovem e recebia o retorno dos pais, que achavam importante falar sobre aquilo — lembra o ator, que estará em “Escrava mãe”, próxima novela da Record.

Roger Gobeth e Samara Felippo eram Touro e Érica na temporada 2005 de 'Malhação'
Roger Gobeth e Samara Felippo eram Touro e Érica na temporada 2005 de ‘Malhação’ Foto: Roberto Moreyra / Agência O Globo

Fernanda Vasconcellos e Thiago Rodrigues também faziam o público sofrer com Betina e Bernardo. Em 2005, os pombinhos, por um mal-entendido, se separam e, no reencontro, a melhor amiga dela, Jaque (Joana Balaguer), engravida do amado.

— Ali era muita empolgação e muita amizade. Foi um ano feliz. “Malhação” foi importantíssimo. Talvez um dos anos mais divertidos dentro da Globo — celebra Thiago.

O sucesso do casal foi tanto que a dupla se reencontrou em “Páginas da vida” (2006) — na qual a personagem dela tem gêmeos dele e morre — e “Tempos modernos” (2010).

—Sempre penso no Thiago com carinho. Acredito que esse sentimento seja fruto de um respeito mútuo, dentro e fora de cena. Ele tem um jeito parceiro de ser que te deixa à vontade, a troca fica mais produtiva e viabiliza o trabalho — teoriza Fernanda, que deixou o quarto ano de Direito para tentar a carreira artística no Rio, não passou no primeiro teste de “Malhação” e só voltou a sorrir cinco meses depois, quando conquistou o papel principal: — A alegria era tão grande que dava até medo.

Fernanda Vasconcellos e Thiago Rodrigues formaram casal por 3 vezes
Fernanda Vasconcellos e Thiago Rodrigues formaram casal por 3 vezes Foto: Roberto Moreyra / Agência O Globo

Outras caras

Nova temporada falará de morte

Grande parte do atual elenco de “Malhação’’ nem tinha nascido quando a novela estreou. Mas os novos rostos continuam conquistando o público como no passado. “Malhação sonhos” alcança bons números de audiência, muito em função do sucesso do casal Perina, interpretado por Isabella Santoni e Rafael Vitti.

— Sempre acompanhei “Malhação” e a temporada que mais me marcou foi a que tinha a Vagabanda (2004), porque adorava a Marjorie Estiano! — lembra Bella, de 19 anos.

O namorado, que nasceu no mesmo ano da novela, dá seu pitaco.

— Tenho lembranças bastante sólidas da temporada do Cabeção.

O diretor Luiz Henrique Rios, responsável pela atual fase, fala do “esforço para reposicionar o programa”.

— O grande desafio é não envelhecer. A gente fala com o cara que tem acesso infinito à informação. Nosso projeto era buscar algo no lúdico. Por isso tem a luta, prima do futebol e do vôlei, e essa questão da arte. Muitos querem ser artistas. E a grande discussão são os novos processos de relação interpessoal — analisa ele.

Emanuel Jacobina adianta o que pretende mostrar na próxima etapa:

— Vamos mostrar como um adolescente lida com a morte e que tipos de pais se tornaram os adolescentes de 23 anos atrás.

(Extra.Globo)