Meligeni: rivalidade Brasil x Argentina não pode virar guerra na Rio-2016
Envolvido com seu trabalho de apresentador e comentarista da ESPN Brasil, e ex-tenista Fernando Meligeni não assistiu à partida inteira do argentino Juan Martín Del Potro com o português João Souza, pelo torneio de tênis da Rio 2016, nesta segunda-feira. Ele foi alertado pela BBC Brasil sobre a briga de um torcedor brasileiro e um argentino, que não só interrompeu as ações como forçou a intervenção de agentes da Força Nacional. Meligeni, hoje com 45 anos, ficou chocado não apenas com o local da confusão, mas também com o motivo.
Nascido em Buenos Aires, em 1971, Meligeni cresceu no Brasil e escolheu representar o país quando se tornou profissional, aos 18 anos.
Não é surpresa que se manifeste quando a rivalidade regional é o tema. Nas mídias sociais, costuma ter discussões acaloradas quando percebe o que chama de exagero nas provocações. Para o ex-tenista, o incidente ocorrido na quadra central do Centro Olímpico de Tênis é consequência também da “banalidade com que a mídia dos dois países lida com a rivalidade”.
“Não interessa a ninguém que isso vire uma guerra”, diz.
BBC Brasil – Você ficou surpreso com o incidente no Parque Olímpico?
Fernando Meligeni – Foi uma coisa triste. São dois povos parecidos e cuja rivalidade é muito mais uma questão de futebol do que qualquer coisa política, por exemplo. Não tem ninguém certo ou errado nessa história. Durante a Copa do Mundo de 2014, por exemplo, vi argentinos exagerando nas provocações no Brasil, achando que poderiam falar qualquer coisa.
Mas os brasileiros também não podem reclamar de argentinos que estejam aqui para torcer por seu time. A partida de tênis era entre um jogador argentino e um português, por que diabos precisava ter confusão entre brasileiros e argentinos?
BBC Brasil – Você costuma ser bastante crítico nas mídias sociais às provocações entre os dois lados, mas isso não faz parte do comportamento esportivo típico?
Meligeni – Não quando passa dos limites. Isso porque essa rivalidade também leva a exageros. Dia desses, quase tive um acidente quando um motoboy furou o sinal. O cara simplesmente disse algo do tipo “tinha que ser um argentino filho daquilo”.
Mas eu moro na Vila Madalena e vi o comportamento ridículo de alguns torcedores argentinos durante o Mundial, arrumando briga. Não interessa a ninguém que isso vire uma guerra, não tem nada a ver com as Olimpíadas. Ou que manche uma competição com uma briga ridícula na arquibancada.
BBC Brasil – Como arrefecer os ânimos?
Meligeni – Para começar, acho que a mídia dos dois países precisa pensar duas vezes antes de incitar provocações e piadinhas. Ela ajuda a alimentar esse clima e é preciso que as pessoas reflitam antes que alguma coisa mais séria aconteça. Isso já poderá acalmar as coisas. Não faz sentido algum em as pessoas ficarem tão tensas.
Cansei de bater boca com jornalistas brasileiros e argentinos nas redes sociais quando vejo comentários que simplesmente só fazem criar tumulto. A rivalidade saudável é legal para o esporte, o resto não tem lugar. Ainda mais no esporte olímpico. Os jogadores também precisam ajudar, até porque o clima entre eles é muito diferente.
BBC Brasil – Mais cordial?
Meligeni – No tênis, por exemplo, os jogadores brasileiros e argentinos sempre foram amigos e vivem juntos no circuito. O Guga (Gustavo Kuerten) e eu temos amigos argentinos do tênis até hoje. Essa rivalidade nunca teve influência fora da quadra, porque simplesmente não faz sentido.
O Del Potro, por exemplo, é um cara ótimo, que quando foi vaiado aqui no Rio em seu jogo contra o Djokovic, levou as coisas na boa. Por isso é que foi triste ver essa confusão. É revoltante que o esporte tenha sido atrapalhado por uma briga. Qual será a próxima vez? Mais gente brigando e as autoridades impedindo brasileiros e argentinos no mesmo estádio?
BBC Brasil – Preocupa a situação?
Meligeni – Ao mesmo tempo em que isso aconteceu, soube que a torcida brasileira aplaudiu de pé a judoca argentina Paula Pareto, que foi campeã olímpica na categoria até 48 kg no sábado (evento na qual a brasileira Sarah Menezes era a favorita e atual campeã). Foi um ótimo exemplo de como as coisas não precisam ser sempre cheias de provocações.