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Museus em alta: 1º semestre de 2019 tem recordes de público pelo Brasil

No primeiro semestre de 2019, museus de arte e história no Brasil tiveram um forte aumento de público em relação ao mesmo período de anos anteriores. O crescimento tem surpreendido os diretores e equipes destas instituições, que tentam entender o fenômeno.

Os recordes não são só em exposições individuais, mas da frequência em geral. Em levantamento do G1 com 40 grandes museus em todas as regiões do Brasil, 37 cresceram. E três bateram recordes.

Na soma destes museus, o 1º semestre de 2019 registrou aumentos de 50% sobre a média do mesmo período nos últimos quatro anos e de 61% em relação a 2018 (veja gráfico abaixo).

G1 conversou com cinco diretores de grandes museus. Eles ainda não têm acesso a pesquisas formais sobre este aumento, mas atribuem o movimento a cinco motivos:

  • Interesse do público despertado em reação a fortes discussões sobre cultura em momento de cortes de verbas federais e estaduais e outros debates sociais acirrados do Brasil hoje;
  • Mais exposições que destacam minorias e grupos antes pouco representados;
  • Além de mais representado, o público ‘se representa’ mais em fotos de visitas no Instagram e outras redes, o que ajuda a divulgar as exposições;
  • “Corrida” por museus após o incêndio no Museu Nacional em setembro de 2018;
  • Políticas educativas e de inclusão adotadas por museus.

Veja os dados:

Um semestre no Museu
Levantamento do G1 mostra visitação a 40 museus brasileiros nos primeiros semestres dos últimos cinco anos
Visitações a museus no 1º semestre201520162017201820191.500k1.750k2.000k2.250k2.500k2.750k3.000k
Fonte: Veja a lista dos 40 museus consultados no final desta reportagem

‘Um ano em sete meses’ no Masp

O Masp (Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand), em SP, já tem em sete meses a maior visitação anual desde 2012, quando teve 556 mil visitantes – recorde histórico. E a marca deve ser batida. Até o final de julho deste ano, foram 533 mil pessoas.

Um ano em sete meses
Público do Masp nos últimos anos (a soma de 2019 já é quase a maior de todas mesmo em apenas 7 meses)
556.354556.354343.236343.236332.215332.215314.859314.859408.391408.391454.031454.031502.642502.642533.000533.0002012 – 12 meses2013 – 12 meses2014 – 12 meses2015 – 12 meses2016 – 12 meses2017 – 12 meses2018 – 12 meses2019 – 7 meses0100k200k300k400k500k600k

O número se deve muito ao sucesso da exposição sobre Tarsila do Amaral, que superou as 402 mil pessoas e se tornou a mais vista da história do Masp. E as outras exposições e acervo permanente, mesmo com bem menos destaque e divulgação, também tiveram bom público.

A partir dos dados expressivos do Masp, o G1 pediu as informações de outros museus em todas as regiões do Brasil. Os dados que o levantamento obteve com 40 instituições indicam que o movimento é generalizado.

Aumento é notado e discutido

“Nós todos estamos refletindo bastante sobre isso, nos questionando sobre os motivos”, disse o diretor-geral da Pinacoteca de São Paulo, Jochen Volz, sobre o aumento de público.

Volz acredita em um comportamento que reflete a situação política e econômica do país. “Estamos vivendo uma radicalização. E os museus são espaços de questionamentos e diversidades de opiniões”, declarou.

“Neste momento político bastante singular, em que não tem havido incentivo à arte, é uma afirmação de que o público está sim interessado na produção”, diz o curador do Masp Fernando Oliva.

Maiores crescimentos
Aumento de público no primeiro semestre 2019 em relação ao mesmo período de 2018
Porcentagem (%)1061068080777749493333Museu Nacional de …Museu da República…Masp (SP)Museu da Inconfidê…Museu de Arte da B…0255075100125

“Na contramão da decadência do tema, nós vemos o aumento do interesse. A sociedade traz a valorização para o setor que não é dada pelo governo”, afirmou Rafaela Lima, coordenadora de análise da informação do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) e responsável pela pesquisa anual de visitações a museus.

As instituições incorporaram angústias sociais. No Museu de Arte da Bahia (MAB), com aumento de 120% entre 2015 e 2019, o diretor Pedro Arcanjo passou a promover debates e encontros sobre conjuntura política, sexualidade, raça e gênero, por exemplo.

“O MAB passava por uma crise cultural. Nós respondemos às questões colocadas pela sociedade brasileira, com diálogos contemporâneos”, diz Pedro.

Público no espelho

Além de discussões, os museus levaram mais diversidade às mostras e investiram em exposições de mulheres, negros, indígenas e artistas não-europeus.

A exposição “Histórias afro-atlânticas” de 2018, com obras de artistas africanos, americanos e caribenhos, se tornou a sexta mais visitada da história do Masp.

De acordo com Oliva, o museu recebeu doação para a reserva técnica de obras de artistas indígenas e prepara uma exposição sobre o tema para 2021.

Imagem da obra 'Pele de bicho, alma de flor', de Yolanda Freire, que fez parte da exposição 'Mulheres radicais' na Pinacoteca de SP — Foto: DivulgaçãoImagem da obra 'Pele de bicho, alma de flor', de Yolanda Freire, que fez parte da exposição 'Mulheres radicais' na Pinacoteca de SP — Foto: Divulgação

Imagem da obra ‘Pele de bicho, alma de flor’, de Yolanda Freire, que fez parte da exposição ‘Mulheres radicais’ na Pinacoteca de SP — Foto: Divulgação

Também no segundo semestre de 2018, a Pinacoteca expôs a mostra “Mulheres radiciais: arte latino-americana, 1960-1985”, dando visibilidade a artistas pouco conhecidas no Brasil.

“A mostra falava sobre estratégias pessoais e coletivas de resistência, de se posicionar e superar situações difíceis. Não é por acaso que teve tanto sucesso no momento que a gente estava – e continua – vivendo”, defendeu Volz.

No Rio de Janeiro, a realidade de comunidades remanescentes quilombolas foi exposta pelas salas do Museu de Arte Religiosa e Tradicional em 2018 e 2019, em Cabo Frio. A exposição “Terra de Quilombo, Retrato de uma Etnia” tinha fotografias de Ricardo Alves sobre o cotidiano, trabalho e cultura de grupos negros, com provocações sobre racismo e exclusão.

Instagram em exposição

Obras clássicas, bonitas, curiosas ou engraçadas… Todas são disputadas por visitantes com celulares a postos pelas salas de exibição dos museus. As selfies, para efeitos reflexivos ou de memes, são divulgadas no Instagram.

'Cristo abençoador', de Jean-Auguste Dominique Ingres, é uma das mais populares do Masp nas redes sociais — Foto: Reprodução'Cristo abençoador', de Jean-Auguste Dominique Ingres, é uma das mais populares do Masp nas redes sociais — Foto: Reprodução

‘Cristo abençoador’, de Jean-Auguste Dominique Ingres, é uma das mais populares do Masp nas redes sociais — Foto: Reprodução

A exposição nas redes sociais ajuda a tornar os museus mais atrativos para pessoas pouco habituadas.

Durante sua pesquisa de mestrado sobre a relação do Masp, museu com maior número de seguidores do Instagram, e a rede social, a pesquisadora Mariana Santana Marques constatou que grande parte do público entrevistado havia ido ao museu após ver uma selfie.

“A partir de então, eles também compartilhavam e influenciaram outras pessoas. Isso contribui para tornar os museus mais acessíveis”, diz Marques.

Tarsila popular

O próprio recorde da exposição de Tarsila está ligado ao foco social diferente.

“Falar em Tarsila como popular tem ineditismo. A relação dela com o popular é um aspecto que vem sendo negligenciado pela história da arte oficial no Brasil.”

“Assim como as questões sociais, raciais e de classe. Ela teve uma relação intensa com o popular brasileiro, como o carnaval em Madureira ou as religiões brasileiras”, explica o curador. É o caso dos quadros “Operários”, “Segunda classe” e “O morro da favela”.

Visitantes olham o quadro Abaporu, de Tarsila do Amaral, em exposição no Masp — Foto: Bárbara Muniz Vieira/G1 Visitantes olham o quadro Abaporu, de Tarsila do Amaral, em exposição no Masp — Foto: Bárbara Muniz Vieira/G1

Visitantes olham o quadro Abaporu, de Tarsila do Amaral, em exposição no Masp — Foto: Bárbara Muniz Vieira/G1

De acordo com ele, o que melhor explica o sucesso da exposição em particular é a abordagem à obra. “O público se sente atraído para rever os artistas sob novas perspectivas, com análises inéditas”.

Museus não se sustentam com ingressos

Os diretores batem na tecla das políticas educativas e de inclusão adotadas por museus. Elas são responsáveis pela formação de novos públicos, além de democratizar o acesso.

Atividades com escolas, dias de ingresso grátis e exposições itinerantes em cidades do interior do estado foram a resposta do Museu Oscar Niemeyer (MON), de Curitiba, às políticas de incentivo à inclusão. Nos últimos cinco anos, ele teve aumento de 68% de público.

Apesar disso, a diretora cultural do MON, Glaci Ito, explica que apenas a arrecadação com ingresso não é capaz de manter as instituições. “Um exposição de grande porte custa entre R$ 500 mil e R$ 1 milhão. Nossa programação é feita com leis de incentivo, como a Rouanet”, explica.

Ou seja: as discussões que a revisão de leis de incentivo despertam podem ser importantes para fazer parte do público pensar mais na cultura e visitar mais museus. Mas, se as verbas forem cortadas, só o aumento da frequência não vai garantir que as exposições continuem.

Museus consultados no levantamento: Masp (SP), Pinacoteca (SP), Museu Oscar Niemeyer (PR), Cais do Sertão (PE), Instituto Tomie Ohtake (SP), Museu do amanhã (RJ), Museu Catavento (SP), Museu do Presépio (PA), Museu de Arte do Rio (RJ), Museu de Arte da Bahia (BA), Museu da Abolição (PE), Museu Casa de Benjamim Constant (RJ), Museu Casa da Hera (RJ), Museu Casa Histórica de Alcântara (MA), Museu Casa da Princesa (GO), Museus Castro Maya (RJ), Museu do Diamante (MG), Museu Forte Defensor Perpétuo (RJ), Museu Histórico Nacional, (RJ), Museu Imperial (RJ), Museu da Inconfidência (MG), Museu Lasar Segall (SP), Museu das Missões (RS), Museu Nacional de Belas Artes (RJ), Museu do Ouro (MG), Museu Regional de Caeté (MG), Museu Regional Casa dos Ottoni (MG), Museu Regional de São João del-Rei (MG), Museu da República (RJ), Museu Solar Monjardim (ES), Museu Victor Meirelles (SC), Museu Villa-Lobos (RJ), Museu das Bandeiras (GO), Museu de Arqueologia (RJ), Museu de Arte Religiosa e Tradicional (RJ), Museu de Arte Sacra da Boa Morte (GO), Museus Raymmundo Ottoni de Castro Maya – Chácara do Céu, (RJ), Museu de Arte Sacra de Paraty (RJ), Museu Palácio Rio Negro (RJ), Casa de Claudio Souza de Petrópolis (RJ).

Fonte: G1