Queda das mortes por Covid aponta indício do efeito da vacinação no Brasil; veja o que se sabe e os alertas
nse de infectologia e Mestre em Medicina Tropical, acredita que já pode haver reflexo da diminuição da transmissibilidade pelo bloqueio vacinal no Brasil.
“As pessoas idosas, profissionais da saúde, com comorbidades e etc estão pulverizadas entre jovens e crianças não vacinadas. Não é o ideal para proteção, mas de alguma forma, a situação está favorecendo, não sendo somente essa razão”, explica a infectologista Helena Brígido.
“A diminuição do número de óbitos de Covid no Brasil está também associada ao grande número de pessoas infectadas, assintomáticas ou não, que têm, não sabemos por quanto tempo, uma imunidade pós-ciclo viral no organismo, apesar de não ser o desejado pela possibilidade de gravidade. Outro item que colabora são as ações restritivas em alguns estados, mesmo muitos não seguindo à risca. Porém, sem dúvidas que a vacinação é o grande destaque, pois pessoas vacinadas ficam protegidas de casos graves e óbitos.” – Helena Brígido
O epidemiologista Bernardo Horta, pesquisador da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), tem opinião semelhante à de Helena e aponta que, na redução das mortes, além da expansão da vacinação, “também contaram o distanciamento social e as medidas de proteção da população”.
Redução de mortes em outros países
Nos Estados Unidos, o início da tendência de queda ocorreu em 1º de fevereiro, quando o país já estava havia sete dias com a média móvel com viés de baixa. Naquela época, já sob a gestão de Joe Biden, os EUA tinham 7,78% das pessoas vacinadas com uma dose e 1,77% com a segunda.
Em 27 de abril, Biden decidiu liberar o uso de máscaras em algumas circunstâncias, quando tinham uma taxa de transmissão (Rt) de 0,84 e 47,38% da população tinha recebido ao menos uma dose.
No Uruguai, o início da tendência de queda aparece em 16 junho, tendo 61,61% da população com 1ª dose e 37,22% totalmente vacinada. Em Israel, a queda começa em 30 de janeiro, com 35% da população com uma dose e 20,68% já totalmente vacinada.
No Reino Unido, a queda começa em 8 de fevereiro, com 18,63% da população vacinada com uma dose e 0,76% totalmente vacinada. Em 10 de maio, a Inglaterra liberou o abraço entre familiares e amigos, quando 52,42% das pessoas já tinham recebido ao menos uma dose.
3 – Uso de vacinas com proteção parcial com 1ª dose
O papel da primeira dose de vacinas como a da Pfizer (75% de eficácia com uma dose) e da AstraZeneca (76% de eficácia com a primeira dose) não foi ainda alvo de estudos de efetividade (análise na população real e não em estudos), entretanto ambas as farmacêuticas disseram nos estudos que elas oferecem proteção parcial. No caso da Pfizer, o Ministério da Saúde inclusive seguiu a estratégia do Reino Unido e ampliou o intervalo entre doses para poder vacinar mais pessoas em menos tempo diante da escassez de vacinas.
O Brasil terminou o primeiro semestre de 2021 com a seguinte distribuição das vacinas aplicadas por fabricantes:
- CoronaVac – 45% (43,2 milhões de doses)
- AstraZeneca – 46,1% (43,7 milhões de doses)
- Pfizer – 7,7% – (7,8 milhões de doses)
- Janssen – 0,7% – (636 mil doses)
“O grau de proteção varia entre as vacinas. Por isso, é complicado (avaliar o impacto da proteção parcial da 1ª dose), depende da vacina, da idade, mas a primeira dose, aparentemente, tem um efeito, que é menor, mas tem”, explica Bernardo Horta, epidemiologista da UFPel.
Helena Brígido, ressalta, ainda, que não é possível ignorar a necessidade das segundas doses. “As vacinas têm o poder de já produzir anticorpos na primeira aplicação do produto. Este ativa o sistema imunológico, que reconhece a substância como invasora, porém, a maioria das vacinas precisa de segunda dose”, diz a infectologista.
O coordenador do Comitê de Infectologia Pediátrica da Sociedade Brasileira de Infectologia, Marcelo Otsuka, faz ressalvas, mas concorda com esse possível impacto. “Vacinas com alta eficácia contra casos sintomáticos têm mais chances de inibir a replicação viral já com uma dose. (…) Mas a proteção contra casos graves vem com a segunda dose”, diz Otsuka.
“Não dá para confiar em uma dose só, não importa o imunizante: se é dose dupla, todos têm que tomar as duas doses. Muitos pensam que segunda dose é um mero “reforço” opcional, o que é um erro”, explica Otsuka.
4 – Melhora nas taxas de ocupação de leitos de UTI
A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) destacou no Boletim Observatório Covid-19, divulgado na quarta-feira (30), que há tendência de melhora nas taxas de ocupação de leitos de UTI para adultos no Sistema Único de Saúde (SUS). Após o colapso em março, a melhora nos indicadores favorece cuidados mais efetivos e ajuda a reduzir também as mortes. Atualmente, apenas 3 estados têm taxa de ocupação acima de 90%.
Os pesquisadores afirmam que esse dado pode ser reflexo da nova fase da pandemia, que “pode ser explicada pela campanha de vacinação, que priorizou os grupos de maior risco ou de maior exposição, como idosos, portadores de doenças crônicas e profissionais da saúde e de diversas outras profissões”.
Melhora nas taxas de ocupação de leitos de UTI em junho de 2021 — Foto: Fiocruz
5 – Redução da taxa de transmissão
Outro dado associado ao atual momento de queda nos indicadores da pandemia no Brasil é a taxa de transmissão (Rt) do coronavírus. O monitoramento do Imperial College de Londres está em queda e atualmento o Rt é de 0,98. Um Rt de 0,98 significa que cada 100 pessoas com o vírus no país infectam outras 98. Na semana passada, o Rt do Brasil estava em 1,13.
Um dado paralelo, que não pode ser considerado oficial, mas que dá dimensão dessa queda foi divulgado nesta quinta-feira (1º) pela Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma).
Segundo os dados da associação, o período de 14 a 20 de junho contabilizou 274.711 testagens, índice 18% abaixo da semana anterior e 28% menor em relação ao intervalo de 24 a 30 de maio – com mais de 373 mil atendimentos.
Do volume total da última semana, 60.174 testes confirmaram o diagnóstico da Covid-19, o que representou uma redução de 31% em comparação com a semana recorde de maio. “E pela primeira vez após quatro meses, o percentual caiu para 22%. Até então, oscilava entre 23% e 25%. Embora ainda não esteja no ritmo ideal, o processo de vacinação vem acelerando e pode ajudar a explicar esses indicadores”, comenta Sérgio Mena Barreto, CEO da Abrafarma.
Atenção: os pontos de alerta
Apesar dos indicadores acima, os especialistas são unânimes em afirmar que a queda das mortes não significa que a pandemia está sob controle no Brasil e que o coronavírus tem apresentado ciclos distintos.
“(A manutenção da queda) depende do comportamento das pessoas. Até mesmo países com quase 50% de vacinados podem passar por subida no número de casos: basta os outros 50% se colocarem em situação de risco de infecção. E com variantes mais transmissíveis, o esforço vacinal terá que se elevar de forma proporcional”, alerta o virologista Anderson Brito, pesquisador de pós-doutorado na Escola de Saúde Pública da Universidade de Yale, nos Estados Unidos.
Além do impacto da vacinação, a redução da curva pode ter relação com medidas de restrição adotadas há um mês e que precisam ser mantidas, sobretudo porque os dados não apontam uma queda geral das mortes para todas as faixas etárias.
“Pode ser que aumente o número de óbitos de novo, sim, mesmo com a vacinação. As mortes que vemos hoje são reflexo de medidas tomadas um mês atrás. Vários lugares tomaram medidas de isolamento e distanciamento”, afirma o infectologista Marcelo Otsuka.
Especialistas ouvidos pelo G1 também demonstram preocupação com a possível chegada da variante delta ao país; considerada mais transmissível e responsável por surto de casos mesmo em países com vacinação avançada.
“Depende, por exemplo, da variante delta. Se entrar forte no país, pode ter novo aumento. Agora, se o cenario não mudar, vacinação avançando e sem novas variantes, aí sim, manteremos esse padrão de queda”, afirma Julio Croda.
Fonte: G1 Bem Estar