Vacina não é vinho ou cerveja: veja 5 motivos para não escolher agora qual imunizante tomar contra a Covid-19
tando a chance de novos casos e mortes.
“Do ponto de vista da campanha, é mais efetiva a velocidade, e não necessariamente a vacina [aplicada]. É importante as pessoas tomarem as vacinas que tiverem. O que conta é a velocidade. Se conseguir vacinar muitas pessoas de forma rápida, consegue impactar a curva”, explica a epidemiologista Ethel Maciel, professora titular da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
Veja, por exemplo, no gráfico abaixo, a diferença de velocidade do Brasil e de países como Estados Unidos, Israel Uruguai e Chile para vacinar 10% de suas populações:
Gráfico mostra diferença de velocidade para alcançar 10% da população vacinada em Israel, Chile, EUA, Uruguai e Brasil. — Foto: Reprodução/Our World in Data/Universidade de Oxford
“A escala logarítmica [do gráfico acima] mede a velocidade. Quanto antes ela sobe [quanto mais reto o traço à esquerda] significa o quão acelerada foi [a vacinação] no início”, explica o cientista de dados Isaac Schrarstzhaupt, coordenador da Rede Análise Covid-19 que analisou os dados para o G1.
O gráfico já considera a diferença de população entre os países para mostrar a diferença de velocidade.
Um ponto importante sobre a cobertura vacinal é que as vacinas usadas no Brasil têm, no geral, eficácia menor do que as usadas nos Estados Unidos, por exemplo (que aplica Moderna, Pfizer e Johnson). Isso significa que é preciso vacinar uma maior quantidade de pessoas para frear a transmissão do vírus.
No estudo em Serrana (SP), os cientistas avaliaram que o controle da pandemia foi feito depois que 75% da população recebeu a segunda dose da CoronaVac. Ou seja: para controlar a pandemia é preciso que muitas pessoas se vacinem.
“O que a gente precisa é que as pessoas sejam vacinadas. Se cada grupo que chegar falar ‘não, eu vou deixar [a vacina A ou B] pro outro’, o outro não vai ser vacinado. Não pode ser uma atitude individual”, reforça Carla Domingues.
E, se isso não acontecer, é possível que mesmo as vacinas com maior eficácia não sejam capazes de proteger as pessoas de adoecerem, explica a pediatra Isabella Ballalai, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
“O sucesso de um programa de vacinação depende [em primeiro lugar] de cobertura vacinal. E a gente está acostumado com o resultado de outras vacinas – que, na verdade, são resultados de um panorama de alta cobertura vacinal. Mas a gente viu, por exemplo, o sarampo – que tem uma vacina com 98% de eficácia – voltar porque baixou a cobertura”, lembra Ballalai.
Além de deixar a população vulnerável, quanto maior o tempo que o vírus leva circulando, maior é a chance de que surjam novas variantes (veja detalhes na pergunta 4).
3) Não há vacinas suficientes para o ‘sommelier’
Nos restaurantes, sommelier é o especialista na carta de vinhos ou de bebidas. No atual momento, o “sommelier de vacina” virou um termo crítico para representar aqueles que escolhem supostamente o que acham ser o melhor. É importante lembrar que o Brasil não tem doses suficientes de nenhuma vacina para imunizar toda a população. Por isso, infelizmente, nem todos poderão ser imunizados com as vacinas que tiveram maior eficácia nos estudos.
“Não existe uma única vacina que tenha a capacidade de produção de garantir que todos os brasileiros fossem vacinados em curto prazo de tempo com a melhor vacina. É por isso que está se vacinando com vacinas diferentes, porque o que a gente quer é ter o maior número de pessoas vacinadas num curto prazo de tempo”, explica Carla Domingues.
Segundo a última previsão do Ministério da Saúde, atualizada na quarta-feira (16), o Brasil deve dispor ao todo, em junho, de cerca de 38 milhões de doses de vacina (37.948.181), distribuídas da seguinte forma:
- Oxford/AstraZeneca: cerca de 20 milhões de doses, sendo 18 milhões da Fiocruz e o restante da Covax Facility.
- CoronaVac: cerca de 5 milhões de doses do Instituto Butantan. Na quarta-feira (16), o Butantan entregou 1 milhão de doses ao Ministério da Saúde.
- Pfizer: cerca de 12,8 milhões de doses, sendo 12 milhões direto da Pfizer e o restante da Covax Facility.
Além dessas, mais 1,5 milhão de doses da vacina da Johnson – que não estavam previstas no cronograma – chegaram ao Brasil no dia 22, levando o total de junho a cerca de 39,5 milhões de doses.
“A gente já está penando para ter vacina. Nós não temos um monte de vacinas disponíveis diferentes para você escolher”, diz Ballalai.
“Se você vai escolher vacina, provavelmente vai ficar sem vacina. E se você ficar sem vacina, várias pessoas vão ficar sem vacina porque escolheram. E aí a gente não vai resolver essa pandemia nunca”, alerta.
4) É prioridade evitar a circulação do vírus e de novas variantes
Quanto mais o vírus circula, sendo transmitido de uma pessoa para outra, mais ele faz replicações, e maior é a probabilidade de modificações, ou mutações, no seu material genético. É daí que surgem as novas variantes.
Essas variantes do vírus podem ou não ser resistentes às vacinas disponíveis hoje; quanto mais variantes surgem, entretanto, maior é a probabilidade de que uma delas seja resistente a uma ou a várias vacinas.
Já há dados que apontam que algumas vacinas não funcionam tão bem contra determinadas variantes – como a da AstraZeneca contra a variante sul-africana (beta/B.1351).
Mas, mesmo nesse caso, a vacina evitou casos graves e mortes, lembra o imunologista Jorge Kalil, pesquisador do Instituto do Coração (Incor) da Universidade de São Paulo (USP).
“As pessoas não sabem qual é a variante que vai chegar até elas. Nós ainda não temos dados suficientes sobre todas as variantes. O número de novos casos e o número de mortes estão enormes. Tem que tomar o que aparecer; esse momento não é de esperar, é de tomar o que estiver disponível”, afirma Kalil.
500 mil mortes: e agora?
O cardiologista Marcio Bittencourt, pesquisador do Hospital Universitário da USP, lembra, também, que não sabemos quais são as próximas variantes que vão circular – e como vão agir contra as vacinas de hoje.
“Depende da variante que está circulando. A gente não sabe qual é a próxima variante que vai circular daqui a dois meses. Então você não está garantindo uma proteção melhor com nenhuma das vacinas para daqui a 2 ou 3 ou 4 ou 5 meses. Daqui a 6 meses pode ter uma cepa que a Pfizer não funcione e que a CoronaVac funcione. Não tem como saber”, pondera.
Ballalai reforça: é necessário, urgentemente, diminuir o número casos no país.
“Porque senão vai perder essa oportunidade. Vamos criar variantes novas aqui no país: o Brasil é considerado celeiro de variantes. Até a hora em que a gente vai ter uma variante contra a qual a vacina não vai conseguir proteger. Aí, sim, a gente está com um problema sério”, alerta.
É o mesmo caso, por exemplo, da vacina da gripe, compara Bittencourt: todo ano uma nova vacina é feita de acordo com as cepas que os cientistas calculam que vão circular naquele ano. “Se a gente erra a cepa, a vacina fica ruim”, diz o médico.
5) Salvar vidas é também uma responsabilidade coletiva
“A vacinação é um ato de responsabilidade social – para eu me proteger e proteger todo mundo à minha volta. Quando eu fico escolhendo vacina, estou pensando só em mim”, afirma Carla Domingues.
Ao se vacinar, aumentar a cobertura vacinal e reduzir a circulação do vírus, você protege a si mesmo e às pessoas ao seu redor – incluindo aquelas que ainda não podem se vacinar, seja porque ainda não estão contempladas no plano de vacinação, porque são crianças ou porque têm algum problema de saúde que as impede.
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“Quanto mais cedo você [se] vacina, mais cedo protege quem mora, trabalha e convive com você. Quanto mais você espera para [se] vacinar, mais deixa exposto não só você mesmo, como todo mundo que convive com você – quer as outras pessoas estejam vacinadas ou não, porque a vacina é para proteger o todo, não uma pessoa”, explica Marcio Bittencourt, da USP.
“Se você atrasa a sua [vacina], deixa o todo ao seu redor desprotegido ou mais desprotegido. Se uma família inteira atrasa a vacina esperando uma vacina que eles acham que vai ser melhor, eles podem todos pegar Covid antes de a vacina chegar. Não tem vantagem nenhuma”, afirma.
Quando a circulação do vírus cai, mais pessoas se vacinam e há menos gente suscetível à doença, cai o número de casos e a probabilidade de que alguém desenvolva um caso grave. Assim, cai o número de pessoas internadas e não há a sobrecarga do sistema de Saúde, que foi vista em praticamente todo o país neste ano. E, claro, milhares de mortes são evitadas.
“Eu me vacino para proteger meu filho, que não vai ter acesso à vacina agora, meu pai, que mesmo vacinado ainda pode adoecer, porque nos idosos a capacidade de produzir anticorpos é menor. Como é que a gente evita a circulação do vírus? É vacinando o maior número de pessoas no menor prazo de tempo. Por isso, não tem sentido estar escolhendo vacina”, reforça Carla Domingues.
‘Se eu tomar a vacina X, poderei viajar?’
Até agora, não há informação de que pessoas imunizadas com a vacina A, B ou C tenham sido impedidas de viajar ou de entrar em algum país. Há duas semanas, a Espanha reabriu as fronteiras para turistas vacinados com alguma das vacinas aprovadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) ou pela União Europeia. Todas as vacinas usadas no Brasil são aprovadas pela OMS, mas o país ficou de fora da lista por ser de “especial risco epidemiológico”.
“A partir do momento que a Covax vai aprovando as vacinas, muito provavelmente todos os países aceitarão”, opina Ethel Maciel, da Ufes.
‘Mas e os efeitos colaterais?’
Você já deve ter ouvido falar nos casos de trombose após a aplicação da vacina da AstraZeneca. Esse risco, entretanto, é raríssimo – e bem menor do que o de desenvolver um coágulo após a própria Covid, segundo cientistas de Oxford.
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Alguns países estão substituindo a segunda dose da vacina por outras de RNA mensageiro – como a da Pfizer e a da Moderna. A epidemiologista Ethel Maciel defende que essa possibilidade de combinação deve ser estudada no Brasil.
“Por exemplo, várias gestantes tomaram a AstraZeneca antes de interromperem [a aplicação]. Essas gestantes poderiam tomar agora a Pfizer como uma segunda dose. Já tem alguns estudos de intercambialidade. Inclusive o próprio Ministério da Saúde já tem dados de pessoas que tomaram errando. Poderia completar o esquema de várias pessoas: pessoas que tiveram reação à AZ na primeira”, opina.
Fonte: G1 Bem Estar