Ação da OAB escancara caos, abandono e omissões no sistema penitenciário do Tocantins
Notícias do Tocantins – A crise no sistema penitenciário tocantinense ganhou um novo capítulo. A Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Tocantins (OABTO) ingressou com uma Ação Civil Pública denunciando o “estado de coisas inconstitucional” nas unidades prisionais do Estado e a negligência da Prefeitura de Palmas quanto às responsabilidades de saúde. O documento, amparado por inspeções realizadas entre junho e julho deste ano, revela um cenário de degradação humana e falência estrutural que compromete a legalidade da execução penal.
Na maior unidade prisional de Palmas, projetada para 300 detentos, abriga hoje cerca de 800. Fotos anexadas ao processo mostram celas abafadas e superlotadas, onde presos dormem no chão sobre colchões rasgados. Em algumas alas, o espaço individual é marcado por números pintados no piso. A taxa de ocupação atinge 267%, situação que se repete em outros municípios e afronta diretamente a Lei de Execução Penal.
Saúde negligenciada e falhas na gestão
Segundo a OAB, as inspeções evidenciam um quadro de abandono médico. Em Guaraí, 178 presos são atendidos por apenas um clínico e um psicólogo, sem psiquiatra nem dentista fixos. Médicos comparecem a muitas unidades apenas uma vez por semana. A escassez de medicamentos é tão crítica que familiares custeiam antibióticos e analgésicos.
Na unidade feminina de Palmas, as consultas ginecológicas dependem de deslocamento externo por falta de profissionais regulares, cuja contratação é responsabilidade da Capital. A prefeitura mantém convênio com o PNAISP – Programa Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade –, criado pela Portaria Interministerial MS/MJ nº 1, de 2 de janeiro de 2014, que obriga o SUS a garantir atendimento integral em parceria com o sistema prisional.
Alimentação precária e protestos
As refeições também são alvo de denúncia. Em Paraíso, detentos protestaram contra comida crua ou estragada, incluindo leite azedo. Em Colinas, servidores e internos relataram que as marmitas chegam em más condições e com baixo valor nutricional. A OABTO aponta que as porções são insuficientes, o que obriga familiares a complementar a dieta dos presos.
Estruturas insalubres e risco à segurança
As inspeções constataram estruturas precárias e improvisadas. Em Augustinópolis, pavilhões foram erguidos como “puxadinhos” sem ventilação. Em Paraíso, detentos do semiaberto ficam confinados em galpões de amianto e sem banho de sol nos fins de semana. Em Colinas, um prédio projetado para 30 pessoas abriga 115 presos. Até agentes penitenciários enfrentam condições indignas: em algumas unidades, eles dormem em salas improvisadas.
Violações de direitos e abuso de autoridade
A OABTO também denuncia violações graves à advocacia e ao direito de defesa. Em Paraíso, audiências virtuais são realizadas por celulares, na presença de agentes e sem privacidade. Em Guaraí, familiares e internos relataram agressões verbais, ameaças e uso indiscriminado de spray de pimenta pelo chefe de segurança, em ambiente sem câmeras de monitoramento.
Exigências da OABTO e alerta constitucional
Na ação, a Ordem pede medidas emergenciais:
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Plano efetivo para combater a superlotação;
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Regularização do fornecimento de alimentos e medicamentos;
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Reforço estrutural em unidades críticas;
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Garantia de sigilo nos atendimentos advocatícios;
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Apuração e responsabilização imediata por abusos.
A entidade reforça que essas providências não são escolhas políticas, mas obrigações constitucionais. “O que vimos nas unidades prisionais do Tocantins é um caso de total desrespeito com a pessoa humana. Entendemos que a liberdade pode ser restringida pela pena, mas jamais à dignidade, à saúde, à integridade e ao acesso à defesa, que são garantias constitucionais e um direito de todos”, afirmou o presidente da OABTO, Gedeon Pitaluga.
Reflexo de uma crise nacional
O caso do Tocantins ecoa o diagnóstico já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal: o sistema carcerário brasileiro vive um estado de coisas inconstitucional. As denúncias da OABTO escancaram não apenas o colapso da política prisional do Estado, mas também um problema estrutural e nacional – o descaso com o cumprimento da lei e com a dignidade humana atrás das grades.
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Fonte: AF Noticias