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Artigo de Opinião | Tocantins e a inclusão: o que mudou e o que ainda precisa mudar

Paulo Alexandre Rodrigues de Siqueira | Promotor de Justiça

Em  21 de setembro, marcamos mais um Dia Nacional de Luta da Pessoa com Deficiência. E a pergunta que não quer calar é: será que realmente estamos lutando, ou apenas fingindo que lutamos?

A Radiografia Tocantinense

Os números falam por si: aproximadamente 135 mil tocantinenses vivem com algum tipo de deficiência – isso representa 8,7% da população estadual, ligeiramente acima da média nacional. São 135 mil histórias, 135 mil potenciais, 135 mil cidadãos que merecem mais que promessas.

Dados que incomodam: Apenas 23% das pessoas com deficiência no Tocantins estão inseridas no mercado de trabalho formal, segundo dados da RAIS 2023.

Em Palmas, cidade planejada que deveria ser modelo de acessibilidade, apenas 34% dos prédios públicos possuem total adequação às normas de acessibilidade. No interior? O cenário é ainda mais desafiador.

Sucessos Para Celebrar

Nem tudo são espinhos. O Tocantins tem cases dignos de aplausos:

O Centro de Reabilitação Lucy Montoro

Inaugurado em 2019 em Palmas, já atendeu mais de 2.400 pessoas com serviços especializados. É referência regional e prova de que, quando há vontade política, as coisas acontecem.

Programa Mais Inclusão

Iniciativa estadual que já capacitou 847 pessoas com deficiência para o mercado de trabalho. Destaque para a parceria com empresas como Energisa, que superou em 40% a cota mínima exigida por lei.

Lei Estadual de Acessibilidade Digital

O Tocantins foi pioneiro ao aprovar, em 2022, legislação específica para acessibilidade em sites governamentais. Resultado: 78% dos portais estaduais já atendem aos padrões internacionais.

Gargalos Que Incomodam

Mas vamos falar das pedras no sapato:

O transporte público que exclui

Realidade crua: Em Palmas, apenas 60% da frota de ônibus é acessível. Em cidades como Gurupi e Araguaína, esse percentual despenca para 30%. Pergunta incômoda: Como garantir direito ao trabalho sem garantir direito ao transporte?

Empresas que burlam a lei

Das 142 empresas tocantinenses obrigadas a cumprir a lei de cotas, 38% ainda estão em desacordo. A desculpa mais comum? “Não encontramos candidatos qualificados.” A verdade? Muitas nem tentam procurar.

Educação Inclusiva Pela Metade

O estado possui 647 escolas estaduais. Quantas têm intérpretes de Libras? Apenas 89. Quantas possuem material didático em braile? 23. Os números não mentem: estamos incluindo no papel, excluindo na prática.

 O custo da exclusão

Vamos falar de dinheiro, já que é linguagem que todos entendem:

  • Potencial econômico desperdiçado: R$ 2,3 bilhões em renda não gerada pela exclusão laboral
  • Custos com benefícios assistenciais: R$ 890 milhões anuais que poderiam ser reduzidos com inclusão produtiva
  • Perda de competitividade: Empresas inclusivas têm 25% mais produtividade

A conta não fecha: É mais caro excluir do que incluir.

O caminho à frente

Metas Urgentes Para 2025/2026:

Transporte: 100% da frota acessível até dezembro de 2026  Empresas: Fiscalização rigorosa e multas que doem no bolso  Educação: Um intérprete de Libras para cada 50 alunos surdos  Digital: Todos os serviços públicos online acessíveis até 2026.

Quem faz o quê:

Governo Estadual:

  • Criar cronograma público de adequações
  • Implementar sistema de monitoramento em tempo real
  • Estabelecer parcerias com universidades para formação de profissionais

Empresários:

  • Cumprir a lei, não por obrigação, mas por inteligência
  • Investir em capacitação interna sobre inclusão
  • Transformar diversidade em vantagem competitiva

Sociedade Civil:

  • Cobrar, fiscalizar, não aceitar desculpas
  • Apoiar organizações que realmente fazem a diferença
  • Mudar o olhar: de “coitadinho” para “cidadão”

E Você, O Que Vai Fazer?

Este não é mais um artigo para você ler e esquecer. É um chamado para ação.

Ações práticas para hoje:

  1. Denuncie: Viu descumprimento da lei? www.mpto.mp.br/Ouvidoria
  2. Aprenda: Faça um curso básico de Libras gratuito no www.palmas.to.gov.br
  3. Cobre: Pergunte ao seu vereador o que ele fez pela inclusão
  4. Contrate: Se você é empresário, seja parte da solução
  5. Compartilhe: Leve este debate para sua mesa de jantar

A única coisa pior que uma sociedade que exclui é uma sociedade que finge que inclui.” – Reflexão necessária para todos nós.

 O Tempo da Mudança é Agora

O Tocantins tem idade suficiente para ter maturidade (36 anos) e juventude suficiente para ter energia. Temos recursos, temos tecnologia, temos exemplos de sucesso.

O que nos falta? Coragem política, responsabilidade empresarial e pressão social.

O que nos sobra? Desculpas, procrastinação e conformismo.

Este 21 de setembro pode ser mais um dia de lamentação ou o primeiro dia de uma revolução silenciosa da inclusão. A escolha é nossa. Para saber mais sobre ações que vem diminuindo a exclusão: Centro de Reabilitação Lucy Montoro: (63) 3218-2100, Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social: SETAS. Associação dos Deficientes Físicos do Tocantins: (63) 3225-4567,APAE Tocantins e Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência, cria o Fundo Municipal da Pessoa com deficiência e dá outras providências (Lei nº 2.164, de 06 de julho de 2015. O Tocantins pode ser o primeiro estado brasileiro a atingir 100% de inclusão real. Mas isso só acontecerá quando pararmos de aceitar que “está bom assim” e começarmos a exigir que “pode estar muito melhor”. A revolução da inclusão começa com você.

SOBRE O AUTOR

Paulo Alexandre Rodrigues de Siqueira possui graduação em Direito pela pela Universidade Federal de Goiás (2000). Curso de Aperfeiçoamento em Direito do Trabalho- EMATRA (2004). Pós-Graduação em Direito Penal – FESURV-GO (2005). Pós-Graduação em Direito Privado- FESURV-GO (2005). Curso de Aperfeiçoamento em Direito Notarial e Registral – LFG (2006). Curso de Aperfeiçoamento em Direito Civil -Faculdade Metropolitana de São Paulo (2019). Curso de Aperfeiçoamento em Direito do Consumidor Faculdade Metropolitana de São Paulo (2019). Curso de Aperfeiçoamento em Direito de Família e Sucessões Faculdade Metropolitana de São Paulo (2019). Pós-graduação em Direito Constitucional e Processo Constitucional pela UFT (2021). Possui Mestrado Profissional e Interdisciplinar em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos pela UFT (2021).Doutorando em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos da UFT/ESMAT 2025/2028.

Atualmente é titular da 15 Promotoria de Justiça da Capital com atribuições exclusivas em: (Direitos Humanos, Direitos dos Idosos, Direito das Pessoas com Deficiência, Assistência Social, Direito da Mulher sob a perspectiva de igualdade de gênero, Direito de Igualdade Social e Racial (população negra, indígena, quilombolas e comunidades tradicionais), Direito a Diversidade Sexual (como a promoção da cidadania e a garantia de direitos para a população LGBTQIAPN+), Direito a Segurança Alimentar e Nutricional e Direito do Consumidor. Compõe na condição de membro do Ministério Público do Conselho de Segurança Pública do Tocantins (CONESP/TO). Membro do Grupo de Atenção Especializada em Segurança Pública do MPTO GAESP (2024/2026) na comissão de Direitos Humanos.

Fonte: AF Noticias